sexta-feira, 27 de julho de 2012


Encontros
Desencontros
Vai e vem de contos
Insatisfeitos se vão
Feito desenhos de ondas
Na areia molhada
Que o mar carrega para si
E devolve outro desenho
Outro amor, outro conto
Desencontros, encontros
Partidas previsíveis
E ainda dói a dor da separa-

ção.

quarta-feira, 25 de julho de 2012

Vento Leve





Vento leve

Só, deixe-me só.
Sem sombra, sozinha
Sem sua presença 
Soprando-me
Sussurros doentes
Deixe-me só.
Sai cedo dos sonhos 
Suados sofridos
Deixe-me só...
Percorreu a casa bafejando
PÁ!
A porta bateu.

terça-feira, 24 de julho de 2012





Valsa do amor

Teu corpo morno
Deitado, enrolado, sugado
Do avesso eu notei

E tuas mãos tão macias
Delícias divinas
Que eu tanto esperei

Vão deslizando em meu corpo
Fazendo contornos
De modo a eriçar

E nessa valsa formosa
Eu danço dengosa
Querendo te amar

segunda-feira, 25 de junho de 2012

Salve-se quem puder!




Foi em um dia desses, sentada no ônibus que eu notei algo diferente. Vi que as pessoas não estavam perdidas em seus pensamentos...muitas delas não carregavam um livro aberto para passar o tempo. Não mais. Todas - ou quase todas - encaravam atônitas a televisãozinha inofensiva instalada dentro do ônibus. Decidi acompanhar a programação para talvez ler alguma notícia interessante, mas não. Era o resumo das novelas da rede globo de televisão. Das seis, sete, oito, nove, dez, enfim, todas que passam durante o dia. "Como assim?!" pensei. Estão nos perseguindo, estão em todos os lugares! Pelo menos em nossas casas podemos escolher ter ou não ter tv, ver ou não ver canal aberto. Mas eles não desistem! Estão no transporte público também. Em seguida começou um programinha com receitas deliciosas para as mulheres donas de casa e depois disso dicas de cursos técnicos para quem quer ingressar no mercado de trabalho...

Será que ninguém vê maldade nisso?

Sim, parece inofensivo, mas os poucos momentos que temos para pensar, refletir sobre as coisas, ler, ouvir um som gostoso, eles estão lá, marcando presença! Acho que nos chamam de 'idiotas' a todo instante, e de fato, somos muito idiotas por achar que tudo isso é normal. Por que será que não tem uma mini biblioteca dentro do transporte público? Não com romances tolos, mas com livros que favoreçam a reflexão. Ao invés disso colocam TV's espalhadas no metrô, no ônibus, no trem, táxis, lanchonetes, restaurantes, bancos, comércios. Ela sempre está lá, ligada no mesmo canal, vomitando mentiras e coisas fúteis para as pessoas que infelizmente perdem muito tempo no trabalho e no único momento que teriam para ficar sozinhas com seus pensamentos, são bombardeadas por comerciais, programas tolos, resumo de novelas e toda essa porcaria.


Não é normal. Para mim chega a ser doentio. Eu encaro como uma perseguição. Você chega no consultório e ela está lá, entra no ônibus e dá de cara com ela. Chega em casa e a primeira coisa que faz é ligar naquele canal que não faz mais nada a não ser estimular a alienação e manipular as notícias.

Acho que esse post é muito mais um apelo do que qualquer outra coisa.

Da próxima vez que você entrar no transporte público e vir essa tvzinha ligada, lembre-se: ouça uma boa música, durma, abra um livro, faça qualquer coisa, mas não perca seu precioso ócio com algo tão improdutivo.

segunda-feira, 23 de abril de 2012

do poder transformador da literatura.




Não entendo porquê ainda existem tantas religiões que brigam entre si para "provar" que o seu deus é o mais verdadeiro. Baseados em quê? Simplesmente na fé?
Utilizando a crítica de Marx e apoiando-me em alguns conceitos de literatura, comecei a me perguntar algumas coisas.

Marx já dizia que a religião é o ópio do povo. Mas vamos além, pois não é apenas essa frase que nos fará entender um pouco da sua crítica:

"A religião não faz o homem, mas, ao contrário, o homem faz a religião: este é o fundamento da crítica irreligiosa. A religião é a autoconsciência e o autosentimento do homem que ainda não se encontrou ou que já se perdeu. Mas o homem não é um ser abstrato, isolado do mundo. (...)
(...)A religião é o soluço da criatura oprimida, o coração de um mundo sem coração, o espírito de uma situação carente de espirito. É o ópio do povo."


(Introdução à Crítica da Filosofia do Direito de Hegel)


Por quê utilizamos a religião para nos confortar? A literatura também tem esse poder. Na verdade, ela tem um poder muito maior do que a religião: o de libertar, de levantar questionamentos, de levar o leitor a enxergar verdades que estão escancaradas na sua cara.


A literatura também desempenha um papel de instituição social, ou seja, o conteúdo social das obras em si próprias e a influência que a literatura exerce no receptor fazem dela um instrumento poderoso de mobilização social! 

É através da literatura que o homem consegue entrar em contato com todo o conhecimento produzido para e pela humanidade. É através da literatura que homens e mulheres fazem uma viagem para dentro de si mesmos, refletindo sobre como chegamos aqui e qual o nosso papel no mundo.

A religião não tem esse poder. Pelo contrário, ela não incita a dúvida, por considerá-la um pecado. Ela nos força a acreditar em algo que não pode ser provado empiricamente. Ela nos dá um falso sentimento de completude e nos controla com seus dogmas.

A literatura nos permite acreditar no ser humano e nos faz enxergar que somos capazes de fazer grandiosidades utilizando a nossa razão.

O mundo não precisa de religiões, nem seitas, nem nada disso que nos cega profundamente. O mundo precisa de literatura.

O povo não precisa ler bíblias ou livros religiosos cheios de dogmas e teorias criacionistas. O mundo precisa de poesias, romances, filosofia e ciência, ou seja, livros que falam da realidade melhor do que a própria realidade o faz (no caso da poesia), livros que tentam explicar o mundo de maneira empírica e racional (ciência e filosofia). Livros que incitem a reflexão e à partir dela o homem consiga descobrir que pode continuar transformando o mundo sem a necessidade de uma religião.

Como seria o mundo se todos tivessem o direito à literatura da mesma forma que todos tem o direito de escolher uma religião?

Assistam ao curta, é uma grande homenagem àquilo que pode nos transformar.

Feliz dia do livro, viva a literatura!



quinta-feira, 19 de abril de 2012

das conversas mais esclarecedoras.

Comecei a sair do trabalho para almoçar.

Ah, sei lá, passar horas e horas lá dentro me impede de conhecer pessoas diferentes e, portanto, de ter mais inspirações para o Catarse.


Conheci essa mulher que leva a vida à espera de clientes. Ela estava no ponto de ônibus, usando uma blusa com decote bem chamativo e assim que cheguei me cumprimentou com um simpático "Bom dia!". Pediu um cigarro e puxou conversa:


- Sabe, bebê, vi você com esse livro na mão e lembrei de um livro que li um dia, na verdade foi o melhor livro que já li, o nome é "Sabedoria dos Fracos". Porque você sabe, os mais fracos são os que mais sofrem preconceito, ninguém quer ouvir o que os bobos tem a dizer. Ninguém dá valor a isso. Na escola eu era assim, bem bobinha, pronto, todo mundo me zoava. Agora imagine só, em casa me tratavam mal, na escola eu era zoada, o que sobrava pra mim?


Continuou: "Eu acho que falta respeito e tolerância nas escolas. Muitas vezes as pessoas que parecem ser bobas, na verdade são gênios! Já conheci muita gente assim, pedreiro, motorista de ônibus, lixeiro, sabe? Essas pessoas que ninguém repara quando passa do lado? Pra mim são muito interessantes. E na escola, bebê, ninguém tá nem aí para os bobos. Não só na escola...


Ela gesticulava e seus olhos brilhavam. "Sabedoria dos Fracos", ela insistia em repetir.
Achei que estava na hora de fazer uma pergunta para aquela moça, então disse "por que fracos?"


- "Ah, eles são fortes, né bebê. Acontece que, eu acho que, bom, as pessoas os veem assim. Como fracos mesmo, aos olhos delas. As pessoas estão pouco se fu%&# para os fracos.


Continuei: "Mas você acha que essas pessoas sabem que não são fracas?"


- Não...pois ninguém falou pra elas. Ninguém nunca olhou nos olhos delas 
bem lá dentro e disse que são fortes. Nem em casa, nem na escola, nunca. E depois elas vão trabalhar e continua assim, ninguém dá bom dia, ninguém pede por favor, ninguém sorri. Mas esses fracos (com uma entonação que deixou a palavra entre aspas) estão por aí e ninguém nunca vai saber se um deles poderia ser um Albert Einstein.


Eu sorri e senti uma imensa vontade de falar que talvez ela fosse uma dessas pessoas que são invisíveis no meio da multidão. Mas calei. O ônibus se aproximava e eu tinha que ir embora. Agradeci pela conversa esclarecedora e enquanto entrava no ônibus ela gritava:

- Vai lá, bebê, sabedoria dos fracos, lê e depois me fala! Tenha um bom dia!


De repente entrei em um outro mundo, todos me olhavam assustados. O que será que pensavam? Que eu também estava à espera de clientes? Que eu não deveria estar conversando com ela? Sorri novamente e lembrei...sabedoria dos fracos. Não encontrei esse livro, nem sei se existe, se é o nome certo, mas não importa.


O que importa é que aquela mulher me beliscou, bagunçou minhas ideias. Aquela mulher foi a inspiração para esse meu post e saber que talvez seja mais uma entre os "fracos" me dá um mal estar. 


É...preciso almoçar fora mais vezes...


segunda-feira, 9 de abril de 2012

da curiosidade das crianças.

- Vó, eu queria muito poder ter um chinelo igual o da Joana, meu pé já tá com caroço!
- Pede nas suas orações antes de dormir, meu bem.
- Mas eu peço toda vez e nunca chega!
- Então você não está pedindo com fé.
- Mas a Joana não pede com fé, ela nem vai na missa.
- Menina feia, deixa de ficar se comparando com os outros. O que Deus te deu tá dado, se você não tem é porque não merece!
- Mas eu rezo todo dia, vó, então esse Deus não é justo, né?
- Ele é sim e se você continuar duvidando dessa justiça não vai nunca ter um chinelo.
- Mas eu nunca tive um mesmo...nem acreditando Nele.
- Você está reclamando de barriga cheia, menina. Já te disse, Deus quis assim, não há o que ser feito contra a vontade Dele!
- Hum. Mas vó, como Deus escolhe as pessoas que serão premiadas?
- Não é prêmio, é benção!
- Tá, mas como ele escolhe essas pessoas?
- Bom, tem que rezar todos os dias...
- Eu rezo!
- ...e tem que rezar com muita fé!
- Então quer dizer que poucas pessoas rezam com fé, né vó?
- Por quê?
- Ah, olha só quanta gente pede um monte de coisas nas orações e os pedidos não são atendidos.
- É, talvez elas não rezem com fé.
- E como é rezar com fé, vó?
- Ai menina, cada pergunta. É rezar acreditando em Deus, mesmo não vendo Ele.
- Igual Papai Noel, vovó?
- É...não, né! Papai Noel é outra coisa.
- Mas eu nunca vi o Papai Noel!
- Menina, deixa de ser pecadora! Não pode ficar comparando Papai Noel com Deus.
- Tá. Se não é parecido, então quem é Deus?
- Ora, é um senhor muito bondoso que ouve nossas preces!
- Você já falou com ele?
- Não, mas...
- Então como sabe que ele é bondoso, vó?
- Ahh menina, deixa de pergunta difícil e vai rezar mais um pouquinho! (levanta e sai...)
- Poxa, eu só queria conhecer melhor o homem que vai me dar um chinelo...

terça-feira, 24 de janeiro de 2012

das definições de amor.

Falar sobre amor é sempre difícil. Defini-lo, então, é quase impossível.

Mas entre uma conversa e outra, e claro, alguns instantes sozinha, comecei a questionar se é possível existir amor incondicional entre um casal. Será?

Busquei algumas definições que consigam sustentar meus argumentos. Vamos lá:

O amor pode ser Eros. Aquele amor carnal, da atração física. É o amor que não dura eternamente e na minha opinião é o único amor possível entre um casal. Parece que após anos de relacionamento esse amor acaba, como a atração física acaba, então só resta a convivência, e por mais estranho que pareça, o costume. Sim, pois é assim que consigo explicar esses casais que ficam uma vida inteira juntos. Todo aquele tesão do início chegará ao fim e só restarão as lembranças e o costume de estar com a pessoa.

O amor pode ser Ágape. Um amor incondicional, espiritual, altruísta. Muitos cristãos afirmam que esse é o amor de Deus por nós. O amor que não exige nada em troca, que não magoa, não fere, não incomoda. Bom, partindo dessa definição acredito que seja impossível existir esse tipo de amor entre um casal. Se você acompanha meu blog há um tempo sabe que eu adoro falar de expectativas. Pois bem, esse amor é livre de expectativas e ciúmes. Um amor fraternal.

Seguindo essa linha de raciocínio, fico me questionando sobre a possibilidade de existir um amor - permitam-me utilizar esse termo - Ágape entre casais. Porque no relacionamento a dois é natural que haja um desejo de ter a pessoa apenas para você. Sei que é assunto para outros posts, mas isso deve-se ao fato de trazermos para as relações afetivas a noção de propriedade privada. Você está comigo, é meu e ponto final. Será mesmo que é possível desprender-se desses sentimentos? Eu adoraria fazer um experimento, porque às vezes fico na dúvida e não consigo comprovar se não vivenciar uma situação do tipo. Mas pelas minhas experiências e até mesmo pelas conversas com outras pessoas, chego a conclusão de que o amor que existe entre um casal é apenas Eros. E obviamente ele acaba. O Ágape não acaba...

Até escrevi há um tempo que o amor é algo muito maior e nós o reduzimos a um sentimento de posse, portanto ele vira mágoa.

E de fato é algo tão maior que não é possível ser atingido numa relação carnal. Porque se existe corpo, existe desejo. O desejo leva ao sentimento de posse, que leva ao ciúme. Se existe ciúme o amor não é incondicional, então não é o amor Ágape. É apenas Eros. E chego até a pensar se Eros pode ser considerado amor, se não é apenas paixão, que é algo mais carnal.

Ou será que o que chamamos de amor não passa de uma necessidade de preencher um vazio infinito? Que na realidade quando falamos para alguém "Te amo", estamos querendo dizer, "nesse momento você me completa", e nada mais.

Sintam-se a vontade para contra-argumentar.

Enquanto isso eu fico aqui pensando...

sexta-feira, 20 de janeiro de 2012

instável X estável




Instável: adj. Que não tem solidez, estabilidade.
Mutável, volúvel, inconstante.
Móvel, movediço.
Diz-se de um equilíbrio que se destrói pela menor perturbação, de uma combinação química que se pode decompor espontaneamente.


Estável: adj. Que permanece firme, sólido: construção estável.
Fig. Permanente, duradouro: situação estável.
Química Diz-se de um composto químico que resiste à decomposição.
Mecânica Diz-se do equilíbrio que não se destrói com uma leve variação das condições.

Eu fiquei perplexa com a instabilidade do tempo em São Paulo.
Eu fiquei embasbacada com a instabilidade do humor das pessoas.
Então, pensei: será que existe algo estável?

Enquanto a chuva caía, meus pensamentos tentavam encontrar a resposta para essa pergunta. Espremi a laranja do cérebro e nada de sair suco. Será que tem alguma relação? Digo, entre o tempo e as pessoas. Claro, besta! Somos parte desse todo e não seria coincidência a existência de alguma relação.

Mas deixando isso de lado...essa instabilidade me fascina, de certa forma. O fato de nada ser previsível, entendem? Nem o tempo, oras! E olha que para o tempo existe uma tecnologia fantástica que permite diminuir a margem de erro. E nós? Não há tecnologia que consiga prever qual será nosso estado de espírito no dia X, ou ainda qual sentimento brotará dentro de nós amanhã ou depois. Porque não somos estáveis.

E é justamente essa instabilidade que traz movimento à vida. É o 'hoje sou, amanhã já não sei mais'. Então porque programar? Por que traçar diversos objetivos sabendo da existência dessa instabilidade? Da existência de sentimentos e situações que são inconstantes assim como o tempo lá fora, que amanhece ensolarado e anoitece alagando cidades. Só para que haja frustrações? Ou é um modo de vivenciar a pseudo-estabilidade das coisas?

Então pergunto novamente: o que é permanente? O que é duradouro? O que é estável? A fé? Deus? Mas se seguirmos o padrão das coisas, como o tempo, as pessoas, se concluirmos que tudo está em constante mutação, então será que podemos atribuir essas consequências àquilo que não conseguimos comprovar cientificamente a existência, como por exemplo Deus? Ele é estável ou não? Será que ele faz parte desse todo que é naturalmente volúvel? Mas aí já seria uma questão para outro post.

Esse teclado que estou utilizando para digitar, por exemplo. Há quanto tempo ele está aqui? Tudo que fizeram para deixá-lo dessa maneira, ele foi modificado, moldado, e continua mudando. As letras estão sumindo, a cor dele já não é mais a mesma. Comigo e com todos nós é igual! Como não? Desde o dia que viemos ao mundo, quantas experiências, situações, traumas, amores nos fizeram o que somos hoje? Então porque não aceitar de maneira natural a instabilidade das outras pessoas? As indecisões, as dúvidas, os medos...porque de certa forma queremos ser permanentes. Queremos nos apoiar em algo que seja sólido, que nos dê firmeza, ainda que seja uma firmeza superficial. E é mesmo.  Mas não há como prever o desmoronamento dessa solidez. 

E continua chovendo...

Foto: 500 days of summer. "Às vezes quando as pessoas crescem, elas crescem separadas", pois não somos estáveis.



quinta-feira, 19 de janeiro de 2012

dos aromas e das memórias.



É tão maravilhosa essa conexão entre a fisiologia e a psicologia do corpo e da mente. Um simples perfume é capaz de nos transportar para um outro tempo. A minha viagem está sendo muito prazerosa. La bella Italia. 

La bella Italia dos parques, das ruas estreitas, dos prédios baixos...da Corso Buenos Aires, da Viale Monza, do Castelo Sforzesco. Do cappuccino com croissant de café da manhã ao som de Elisa.

Cada vez que respiro e trago para dentro do nariz o cheiro do perfume que estou usando hoje, vejo imagens de Roma, Vaticano, Coliseu...lembro da voz no metrô "Fermata Loretto, Fermata Loretto". Dos passeios no Duomo, do sorvete de chocolate fondente, do Bartender, Ciu's e Blender. Os coquetéis, o sotaque italiano ao pedir um 'Strawberry Fruitcup'. Do chefe de cozinha, do Fabrizio, da Greta, Francesco, Fabio e muitos outros que passaram dias, semanas, meses comigo.

Respiro novamente e posso ouvir o barulho dos bondes passando pela cidade, posso ouvir os clientes perguntando às 16:00 da tarde "Siete aperti"?

A brisa, a neve, o sol, o verão, beijos, abraços, novidades, solidão, tristeza, mágoa, desespero, viagens, loucuras, porres...

E tudo ficou lá e aqui ao mesmo tempo. Deixei uma parte de mim na Itália e trouxe uma parte da Itália comigo. Deixei alguns cabelos espalhados pelas ruas, toquei nos monumentos, abracei italianos e fui capturando tudo que cabia nos meus braços, até transbordar. Joguei moeda na Fontana di Trevi e me senti um Gladiador ao entrar no Coliseu.

É um filme que passa na minha cabeça neste exato momento. Não quero apertar 'stop'...

...essa coisa de memória olfativa é simplesmente demais!


Foto: Piazza San Pietro - Vaticano


quarta-feira, 18 de janeiro de 2012

olhos de ressaca.



"Olhos de ressaca? Vá, de ressaca. É o que me dá idéia daquela feição nova. Traziam não sei que fluido misterioso e enérgico, uma força que arrastava para dentro, como a vaga que se retira da praia, nos dias de ressaca. Para não ser arrastado, agarrei-me às outras partes vizinhas, às orelhas, aos braços, aos cabelos espalhados pelos ombros, mas tão depressa buscava as pupilas, a onda que saía delas vinha crescendo, cava e escura, ameaçando envolver-me, puxar-me e tragar-me. Quantos minutos gastamos naquele jogo? Só os relógios do céu terão marcado esse tempo infinito e breve. A eternidade tem as suas pêndulas; nem por não acabar nunca deixa de querer saber a duração das felicidades e dos suplícios. Há de dobrar o gozo aos bem-aventurados do céu conhecer a soma dos tormentos que já terão padecido no inferno os seus inimigos; assim também a quantidade das delícias que terão gozado no céu os seus desafetos aumentará as dores aos condenados do inferno. Este outro suplício escapou ao divino Dante; mas eu não estou aqui para emendar poetas. Estou para contar que, ao cabo de um tempo não marcado, agarrei-me definitivamente aos cabelos de Capitu, mas então com as mãos, e disse-lhe,–para dizer alguma cousa,–que era capaz de os pentear, se quisesse."
- Machado de Assis in “Dom Casmurro”

Deixe-me penteá-los, então.
Deixe-me admirá-los. Deixe-me...assim.
Música: Elephant Gun - Beirut

quinta-feira, 12 de janeiro de 2012

Hey, Newton.





Nada como ficar sozinha. Pode ser triste, mas geralmente é na solidão que consigo organizar meus pensamentos e me dedicar à uma das atividades mais prazerosas que existem: ler.

Claro que também surgem perguntas conflitantes e sozinho é assim: você e suas teorias, suas dúvidas, sem ninguém para ajudá-lo. Talvez um livro ou outro, mas não é uma biblioteca. De pijama, na cama, li:

"Se pudéssemos desligar a força gravitacional entre a Lua e a Terra, a Lua se moveria em linha reta com velocidade constante, tangente à sua órbita."

Como se alguém amarrasse uma pedra em uma corda e começasse a rodar a corda. "Soltem a corda!", pensei. Exato, a pedra também se moveria em linha reta com velocidade constante, tangente à sua órbita. Soltem a corda, então.

Foi quando percebi que a única pessoa capaz de soltar a corda sou eu. Não preciso dessa gravidade que um dia pode ser grave para mim mesma. Não quero satélites presos à minha órbita. Será? Ainda ontem me disseram que eu quero sim, só não desejo aceitar esse 'querer'. Percebi que meu movimento é circular, porque afinal de contas eu volto sempre no mesmo ponto, pelo menos nos meus pensamentos. Então soltem a corda e deixem-me vagar deliciosamente pela amplitude da minha alma. Mas a questão é justamente essa: a minha corda foi solta e não aconteceu comigo o que aconteceria com a Lua ou com a pedra...ainda não.

Talvez porque essa força não seja tão fraca como a gravidade.

E se eu soltasse a corda, o que aconteceria?

Foi um simples trecho do livro que me levou a essas perguntas que ainda não tem respostas. E foi com um livro de física que eu consegui enxergar a parte mais humana de mim, a parte que eu tentei esconder até então.

Só não consegui descobrir se sou a Lua ou a Terra. Se sou a pedra ou a mão que gira a corda.